Há 22 anos, começou a circular em Porto Alegre, no sul do Brasil, um jornal todo feito por pessoas em situação de rua ou vulnerabilidade social. O Jornal Boca de Rua surgiu da vontade de um grupo de jornalistas de ver essas pessoas falando por si mesmas, não apenas retratadas como vítimas ou sob o estigma de miséria.
O projeto foi idealizado em 2000 e um ano depois, durante o primeiro encontro do Fórum Social Mundial, foi lançada a primeira edição do Boca, como é conhecido. Hoje, o jornal é o único dentre os filiados à International Network Street Papers (INSP), associação mundial de publicações produzidas por pessoas em situação de rua, integralmente elaborado por essa população.
A publicação do Boca é trimestral e sua cobertura abarca desde denúncias de violações sofridas por quem está na rua a histórias positivas. Ao longo de três meses, o grupo se organiza para definir pautas, sair a campo, realizar entrevistas, fotografar e colher depoimentos para as matérias. A rotatividade dos membros é alta, mas em média cerca de 50 pessoas trabalham em cada edição.
Após a impressão, cada membro do grupo recebe uma cota de exemplares para comercializar nas ruas de Porto Alegre. O valor arrecadado é todo dos repórteres-jornaleiros. A publicação também se mantém com doações de apoiadores, muitos deles anônimos, que não pedem contrapartida pela contribuição.
Boca já não mora na rua
Atualmente, o Boca deixou de ser “morador de rua”. Agora tem um teto – a Casa Alice, que fica na Olavo Bilac, 188, Cidade Baixa.
Para quem não sabe, ALICE significa Agência Livre para Informação, Cidadania e Educação (ALICE). “Ter um espaço próprio é muito importante porque representa dignidade, responsabilidade, conquista. Todos temos direito de ter uma casa. Agradecemos aos parceiros que nos abrigaram neste tempo de 22 anos de existência do jornal, em especial a Associação Amigos da Cabo Rocha, nossa última “moradia””, nos conta Rosina Duarte.
Rosina, uma das idealizadoras do Boca de Rua e da ONG ALICE (Agência Livre para a Informação, Cidadania e Educação), a qual o jornal está vinculado, conta que o objetivo inicial era “dar voz a quem não tem.” Com o tempo, porém, perceberam que isso era presunçoso — as vozes sempre estiveram lá, a sociedade apenas não as escutava, diz ela.
A ideia inicial dos jornalistas era a criação de uma rádio transmitida em alto-falantes instalados nos postes da cidade. Mas ao entrar em contato com um grupo de moradores de rua, eles foram assertivos: “Queremos um jornal sobre nós”. Rosina diz que a ideia, a princípio assustou, mas deu certo.
A ideia inicial dos jornalistas era a criação de uma rádio transmitida em alto-falantes instalados nos postes da cidade. Mas ao entrar em contato com um grupo de moradores de rua, eles foram assertivos: “Queremos um jornal sobre nós”. Rosina diz que a ideia, a princípio assustou, mas deu certo.