Recanto do surfe no litoral sul de Pernambuco, com águas mornas, vasto coqueiral e diversidade natural, a praia de Maracaípe, a 65 km do Recife, é reconhecida internacionalmente por suas belezas. A autoestima turística da região também busca ser estendida à comunidade local pela ex-surfista profissional Nuala Costa através da ONG Todas Para o Mar (TPM). O projeto nasceu com o objetivo de dar visibilidade ao surfe feminino através do Festival Maraca Surf Festival. E, após notar uma baixa aderência ao surfe, em 2017, é criado o projeto Inclua Surf TPM, para crianças e jovens, conscientizando a população sobre o empoderamento feminino e também práticas antirracistas, que potencializam as capacidades das dezenas de famílias atendidas.
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Nuala começou sua carreira no surfe aos 16 anos, por meio de um projeto social. Apesar do talento, se deparou com a invisibilidade e a falta de patrocínios como consequência do racismo estrutural. Mesmo sem apoio, participou de campeonatos e conquistou boas colocações, como o Campeonato Brasileiro de Surf amador, Super Trials e o Circuito Nordestino de Surf. Essa falta de apoio levou Nuala a um esgotamento emocional, fazendo-a sair do país e arriscar a viver na Europa durante quinze anos, ao lado da mãe e dos irmãos que já moravam no país em busca de melhores condições de vida. No primeiro momento, Nuala morou em Portugal e, quatro anos depois, foi para a Espanha. Trabalhou como diarista, secretária, gerente de bar e tripulante de um iate e, nessa época, também foi mãe.
Ao retornar ao Brasil, em 2015, deparou-se com as mesmas dificuldades entre as surfistas, principalmente as negras e nordestinas, criando a ONG para empoderar e tornar visíveis os rostos desconhecidos pela falta de apoio tanto do poder público quanto da iniciativa privada.
“Com a construção do coletivo TPM, fui notando que essas dificuldades não se restringiam apenas às mulheres negras periféricas, onde as mulheres de forma
geral precisam de fortalecimento, reconhecimento e empoderamento. A proposta do coletivo se tornou seu propósito de vida, onde pretende torná-lo em um projeto socioeconômico que atenda as necessidades da comunidade”, diz Nuala, com o empoderamento de quem pratica surfe há 26 anos. “As dificuldades servem para fortalecer e crer que é possível incentivar outras mulheres a se empoderar”.
PARA ALÉM DO SURFE
Além do esporte, a ONG também aborda questões de empoderamento, educação antirracista e de empreendimento para a comunidade local. Para a fundadora, Nuala o suporte à comunidade é uma ferramenta fundamental para mudar a realidade da região. “Nós reconhecemos que o acesso ao esporte, cultura, educação e o empreendedorismo feminino são fundamentais para a construção de uma identidade positiva da comunidade além de diminuir os efeitos do racismo ambiental”, afirma. Com a atividade oferecida pela TPM, o projeto mantém 95% de seus alunos inscritos até hoje.
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Atualmente, são atendidas cerca de 120 mulheres e 80 crianças e adolescentes na faixa entre 7 aos 17 anos e, majoritariamente, negros. Um trabalho que impacta, indiretamente, 250 famílias da localidade. Apesar de ser reconhecida internacionalmente, a região tem enfrentado desafios ambientais e sociais. Enquanto a praia é conhecida por suas belezas naturais e atividades de surfe, a comunidade local – em sua maioria, pescadores, jangadeiros, artesãos e comerciantes informais – sobrevivem da renda de suas funções e enfrentam a desigualdade socioambiental. A especulação imobiliária e a expansão do turismo de forma insustentável têm impactado negativamente, levando à exclusão de políticas públicas e à falta de acesso a serviços básicos, como saneamento básico e educação de qualidade.
Para entender a necessidade de cada família, são realizadas visitas em domicílio a fim de entender a rotina e necessidades de cada jovem, assim a ONG consegue auxiliar não apenas com as atividades realizadas na sede da TPM, como também apoiar aos tutores e no desenvolvimento escolar. As atividades propostas envolvem aulas de surfe, oficinas para confecção de pranchas, e a participação em campeonatos. Além disso, a ONG disponibiliza aulas de letramento racial, alfabetização, de espanhol, capoeira, maracatu, afoxé, arteterapia, teatro, dança e sessões de cinema.
CONSTRUINDO O FUTURO
“É um orgulho muito grande quando olhamos para trás e vemos o impacto da TPM na comunidade, são oito anos com muito aprendizado e também de amor pela transformação desses jovens. Manter uma ONG é um grande desafio, então o nosso objetivo é atrair mais voluntários e também possíveis marcas para se tornarem nossas parceiras”, conta Nuala. Apesar do crescimento da ONG, a captação de recursos e voluntários é um dos desafios que organizações não governamentais mais enfrentam.
Além de Nuala, a ONG conta também com Lígia Levy, educadora e mestra em geografia que atua na gestão do desenvolvimento dos projetos, e também de uma direção composta por Stella Francisca, Alyne Nunes, Alexsandra Simoes e Micheline Araujo. Conta com o apoio de empresas parceiras, como Surf Guru, Pousada La Bella Luna, Setta Energia e Via Água, que garantem contribuições mensais para a manutenção do projeto, enquanto doações espontâneas ajudam a cobrir despesas mensais.
O crescimento de pessoas assistidas pela TPM ao longo dos 8 anos de existência ultrapassou a marca de 300 pessoas direta e indiretamente, e como próxima meta, Nuala pontua que a sede do projeto terá que expandir para receber ainda mais pessoas.
Com diversos objetivos de transformação social, hoje a maior parte das famílias atendidas pela TPM são de pessoas negras, em idade escolar e de baixa renda. Nuala, que já se viu na mesma posição dessas famílias, destaca a importância de oferecer um atendimento e incentivo para a comunidade como um todo. “Desde que decidi criar a ONG, me coloquei no lugar desses jovens para entender qual o tipo de acolhimento que eu gostaria de receber. É importante pensar no jovem, mas não é o suficiente se não tivermos um atendimento que inclua também a família deles”, diz a ex-surfista. “Hoje em dia, com o acesso à internet e com as mudanças de costumes, é preciso combater não só a evasão escolar, no nosso caso o esporte é um dos nossos alidados, como também proporcionar o letramento racial para que essas crianças construam sua autoestima e enxerguem que a cor delas não as impede de chegarem a posições de liderança, além de trabalhar também a educação social para que elas entendam as questões como educação sexual, inclusão de gênero e outras diversidades que existem”.
RELAÇÃO DAS ATIVIDADES
Alinhados com 14 dos 17 ODS da ONU, a Todas Para o Mar oferece mais de 10 atividades para a comunidade de Ipojuca.
- Aula de Espanhol – Segunda-feira
- Inclua Capoeira – Terça-feira
- Aulas de apoio escolar (Surfando no Conhecimento) – Quarta-feira
- Afoxé – Quinta-feira
- Maracatu – Sexta-feira
- Dança e Teatro – Sábado
- Inclua Surf – Sábado
Para as mulheres são oferecidos cursos profissionalizantes semanais como o Prospera Mulher (estética), de empreendedorismo através do artesanato, e também de capacitação produtiva para pescadoras. A ONG também promove encontros como o Todas Podem Menstruar!, que aborda a saúde da feminina e dignidade menstrual.
Àqueles que quiserem se voluntariar ou oferecer algum suporte, é possível entrar em contato com a ONG através do email coletivo@todasparaomar.org.