Menos de um terço das famílias autorizaram a doação de órgãos, após o diagnóstico de morte encefálica, de acordo com um levantamento feito por pesquisadores da Unisinos, no Rio Grande do Sul. O estudo analisou os registros de documentos de entrevistas familiares realizadas em 2022 por uma organização de procura de órgãos (OPO) do Rio Grande do Sul (RS) com o objetivo de conhecer as justificativas de familiares para a não autorização da doação de órgãos e tecidos. Entre as principais justificativas para a recusa estão o fato de a pessoa não ter se declarado doador em vida, a falta de consenso familiar sobre a doação e a decisão da família por preservar a integridade do corpo do ente. Os resultados detalhados das motivações para não doação foram publicados em um artigo no periódico científico “Brazilian Journal of Transplantation”.
A equipe, que contou com pesquisadores de instituições gaúchas, analisou os registros de entrevistas com familiares de potenciais doadores feitas por uma Organização de Procura de Órgãos e Tecidos no estado do Rio Grande do Sul. Foram analisados documentos de 121 entrevistas e, os autores identificaram 33 autorizações para doação, 65 negativas e 23 casos de contraindicação médica para a doação. Entre as negativas, 39 casos foram excluídos por falta de informações sobre a justificativa para a recusa da doação. Por isso, o montante analisado foi de 26 casos.
Em metade deles, a doação de órgãos não foi efetivada porque a pessoa que morreu se manifestou contrariamente à doação em vida ou não externou a vontade de ser doador. Em quatro casos, houve falta de consenso familiar, em três houve preocupação dos familiares sobre a preservação do corpo e, em outros três, receio sobre o tempo de espera para liberação do corpo. Questões religiosas foram apontadas em apenas dois casos, entre outras justificativas.
“Temos uma fila de espera gigantesca por órgãos no Brasil. Algumas doenças têm o transplante como único tratamento, mas ele só acontece se houver a doação e, para haver doação, além de generosidade, é preciso conhecimento sobre o processo e sobre o desejo das pessoas”, diz a enfermeira Patrícia Treviso, autora do artigo e orientadora do trabalho de conclusão de curso que o originou.
Para ela, é importante que aqueles que querem ser doadores manifestem a vontade em vida às suas famílias. “Normalmente as famílias querem honrar esse desejo do familiar que faleceu”, afirma. Vale lembrar que, ainda que haja manifestação em cartório, quem autoriza a doação sempre são os familiares. “É fundamental conversar em família e dizer se você é doador, para que a família possa respeitar a sua vontade. Vale destacar que quando não há consenso familiar, a doação não acontece”, observa a enfermeira.
Os resultados também podem contribuir para a implementação de campanhas e estratégias de comunicação sobre a doação de órgãos. “Falar sobre a morte pode ser difícil na nossa cultura, mas a doação de órgãos não é sobre a morte, e sim sobre a possibilidade de salvar outras vidas”, diz a enfermeira Maria Eduarda Pasquotto, primeira autora do artigo. As pesquisadoras destacam a importância do registro completo e detalhado da entrevista com os familiares de potenciais doadores, a fim de que novos estudos possam ser realizados.
Fonte: Agência Bori