Uma nova reação química pode transformar uma substância extraída de uma árvore nativa da América do Sul em um medicamento para tratamento de câncer.
Portal de Notícias da UFSC destaca resultados promissores de uma pesquisa científica realizada pelo Laboratório de Catálise Biomimética, em parceria com instituições da Inglaterra, de Portugal e da Espanha.
Com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento de terapias contra o câncer que tenham menos efeitos colaterais que os tratamentos convencionais, os pesquisadores criaram uma nova metodologia de ativação de uma molécula chamada β-lapachona, encontrada no Ipê Roxo.
A substância tem baixo custo de extração e conhecidas propriedades anticancerígenas, no entanto, não pode ser usada em sua forma natural.
“Por que a β-lapachona nunca avançou em testes? Porque ela não ataca só a célula do câncer. Ela também ataca outras células do corpo humano, fazendo com que se tenha efeitos colaterais muito graves. Então não vale a pena usar ela como um fármaco”, comenta Gean Michel Dal Forno, doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Química, em entrevista para o Portal de Notícias da Universidade.
De acordo com o pesquisador, foi preciso buscar uma maneira de fazer com que a β-lapachona afetasse somente as células do câncer. O primeiro passo foi desativar a molécula, transformando-a em um pró-fármaco, uma substância que entra no corpo de forma inativa, para ser ativada depois, em condições específicas – no caso dessa pesquisa, somente quando em contato com o tumor.
“O que a gente faz é pegar essa molécula e fazer uma transformação química. Então, no laboratório, a gente desenvolve uma reação que vai fazer uma pequena alteração na estrutura e faz com que essa molécula deixe de ser um fármaco. Nesse caso, eu tenho pró-fármaco, que é um fármaco que foi modificado para perder sua atividade contra o alvo”, resume o pesquisador.
O método e o Nobel
A principal inovação do estudo de Gean é o método para ativar o pró-fármaco nas células cancerígenas, usando nanopartículas de paládio e técnicas de química bio-ortogonal, área que foi tema do prêmio Nobel de Química em 2022. De acordo com o pequisador, a química bio-ortogonal trata de reações que ocorrem em organismos vivos sem alterar as características e os processos naturais daqueles organismos.
Em teste com animais, a redução do câncer foi de 43%
A metodologia foi testada em células de câncer de mama e de leucemia cultivadas em laboratório e em embriões de peixe-zebra. “Nós enxertamos uma célula do câncer nesse embrião, e junto com essa célula foram também enxertadas essas nanopartículas, que são os nossos catalisadores. Então, quando a molécula que não é ativa chega lá, ela encontra o catalisador e é liberada. Isso faz com que eu só a tenha dentro do tumor, e não afete o resto dos órgãos do modelo animal”, explica o cientista.
Os experimentos indicaram um significativo efeito antitumoral. Nos peixes, a redução do câncer foi de 43%, e não foram observados danos em outras células dos animais. Com resultados promissores, o processo de ativação teve um pedido de patente depositado pelos pesquisadores, mas ainda são necessárias muitas etapas antes de se chegar aos testes com humanos. “É um estudo que ainda está numa fase muito inicial. A primeira coisa é que conseguimos descobrir essa nova reação química para liberar esse composto, e conseguimos mostrar que ela já funciona em algum tipo de modelo mais complexo”, afirma Gean.
- Conteúdo extraído do Portal de Notícias da UFSC