Por João Vitor Figueira e Rodrigo Torres
Luciano Vidigal acaba de se tornar a primeira pessoa negra a vencer o Troféu Redentor de melhor direção de longa-metragem de ficção na competição principal do Festival do Rio 2024. O cineasta conquistou esse feito inédito com Kasa Branca — um “favela movie” diferente, que representa a periferia com um olhar poético e retrata as masculinidades negras sem estereótipos.
“O Nós do Morro está completando 38 anos de resistência”, disse Luciano Vidigal, bastante emocionado, fazendo várias menções de ancestralidade e tendo a grandeza de falar do coletivo em um momento tão importante de conquista pessoal. Por isso mesmo, o cineasta fez questão de discursar ao lado de Juan Paiva, mestre de cerimônias da solenidade que também é cria do programa. “Quando um homem preto sobe aqui, ele não está sozinho!”, completou o diretor carioca, na cerimônia de premiação da Première Brasil que aconteceu neste domingo (13), no histórico (e neon) Cine Odeon.
Kasa Branca acompanha Dé (Big Jaum), um adolescente negro da periferia da Chatuba, no Rio de Janeiro, que recebe a notícia de que sua avó, Almerinda, está na fase terminal da doença de Alzheimer. Dé tem o apoio dos seus melhores amigos, Adrianim (Diego Francisco) e Martins (Ramon Francisco), para enfrentar o mundo e aproveitar os últimos dias de vida com ela.
“Sou o único diretor preto da [competição principal de ficção] Première [Brasil], mas eu estou com os meus ancestrais. Porque quando a gente escolha a narrativa preta, temos de cuidar disso com respeito, com poesia, que aí a glória vem. Agradeço muito ao júri por ter entendido a busca por essa poesia”, comentou.
Nascido e criado no Morro do Vidigal, Luciano Vidigal dirigiu segmentos em 5x Favela: Agora por Nós Mesmos (2010) e 5x Pacificação (2012) e dirigiu Cidade de Deus: 10 Anos Depois (2013) ao lado de Cavi Borges. Kasa Branca é o seu primeiro trabalho solo como diretor de longa-metragem.
“Quando o Cacá Diegues me convidou para dirigir um dos episódios de 5x Favela, ninguém queria fazer um segmento sobre violência, e eu acabei dirigindo o mais violento”, ele lembrou, no debate de Kasa Branca, rindo de nervoso e lembrando que, já naquela época, seus colegas e ele próprio vinham “fugindo disso”.
“A maioria das pessoas que vivem nesse lugar são pessoas trabalhadoras, são pessoas afetuosas. Infelizmente, havia uma defasagem desse tipo de narrativa no cinema brasileiro”, lembra Luciano Vidigal, hoje um vencedor do Troféu Redentor justamente por contar uma história com a sua visão (autoral e independente) de homem preto favelado, com muito orgulho, dignidade e talento.