A ciência cidadã é uma prática em que pessoas não acadêmicas colaboram com cientistas em atividades de pesquisa. Cientistas, gestores e outros profissionais que aplicam ciência cidadã em projetos sobre poluição marinha relatam que a abordagem tem impacto positivo na educação da população, contribuindo para o aumento de dados coletados e para a efetiva redução dos resíduos nos ecossistemas costeiros. Por outro lado, a dificuldade em manter o engajamento contínuo dos voluntários, a falta de recursos financeiros para as atividades e falta de reconhecimento da validade científica por parte de tomadores de decisão são barreiras para que a prática atinja seu potencial.
É o que indica um artigo publicado na quarta (30) na revista científica Marine Pollution Bulletin, assinado por pesquisadores das universidades brasileiras Federal do ABC (UFABC) e de São Paulo (USP) com cientistas das universidades de Surrey e Plymouth, do Reino Unido.
O estudo ouviu 56 profissionais com experiência em projetos sobre lixo marinho distribuídos em 13 países, incluindo o Brasil. As respostas, coletadas por formulário online, abordaram a atuação do profissional e suas percepções sobre a ciência cidadã. Os relatos foram organizados em 19 categorias, nove relacionadas às vantagens e dez aos desafios identificados.
Os principais benefícios mencionados envolvem três frentes: ganhos para a ciência, como redução de custos na coleta de dados e ampliação da abrangência geográfica das informações; para o meio ambiente, como a diminuição de resíduos; e para os cidadãos, como o aprendizado – citados quase duas vezes mais que os ganhos científicos e quase quatro vezes mais que os ambientais.
Embora a participação seja vantajosa para os cidadãos, envolvê-los de forma mais permanente nesses projetos foi a dificuldade mais citada pelos entrevistados, presente em 48% das respostas. “Seria muito importante que estratégias de avaliação desses impactos fossem pensadas pelos coordenadores de projetos e cientistas”, explica Natália Ghilardi-Lopes, pesquisadora da UFABC e autora do estudo. A pesquisadora ressalta que a maior inclusão da ciência cidadã em documentos, como políticas públicas, editais de fomento à pesquisa e relatórios, também pode ajudar a enfrentar essas barreiras.
O artigo ainda apresenta cinco recomendações para melhorar a eficácia dos projetos de ciência cidadã voltados à poluição marinha: reconhecer os limites e os pontos fortes da prática; promover colaboração entre projetos; aumentar o reconhecimento e valorização da ciência cidadã; ouvir e apoiar de forma mais efetiva os voluntários; e garantir financiamento sustentável. “Se as recomendações forem seguidas, nos próximos cinco anos já teremos várias iniciativas adotando protocolos padronizados e formando cientistas cidadãos comprometidos com a geração de dados de boa qualidade”, prevê Ghilardi-Lopes.
Segundo Alexander Turra, professor da Universidade de São Paulo (USP) e coautor do estudo, o momento é estratégico para colocar o tema em pauta. “A segunda reunião da última rodada de negociações do tratado global sobre poluição plástica vai terminar em agosto de 2025”, lembra. Ele afirma que a ciência cidadã será essencial para gerar indicadores sobre lixo marinho e alcançar as metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), em especial o ODS 14, até 2030. “É uma estratégia importante tanto para o levantamento de informações como para o envolvimento da população no processo de produção de conhecimentos”, conclui.