O Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP e mais seis organizações criaram um novo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), com o lema Superar a tríplice monotonia do sistema agroalimentar. A iniciativa tem como objetivo mobilizar uma rede de parceiros para que o sistema agroalimentar brasileiro contribua para enfrentar a tríplice crise planetária.

O trio de problemas citados pelas organizações baseia-se em questões de paisagens ambientais, cada vez mais suscetíveis a mudanças climáticas drásticas, na criação de animais de produção industrial, com a utilização de antibióticos, e nas dietas baseadas em produtos ultraprocessados. Ricardo Abramovay, professor da Cátedra Josué de Castro da Faculdade de Saúde Pública da USP, é responsável pelo estudo e conta mais sobre ele. “Quando a gente pensa em segurança alimentar e erradicação da fome, a primeira coisa que vem ao espírito é transferência de renda, distribuição de alimento, o que é básico. Países democráticos não podem ter populações passando fome; garantir o acesso ao alimento para que ninguém passe fome, isso é básico. Mas isso, muitas vezes é tomado como um ponto de chegada, mas deveria ser um ponto de partida.”
A tríplice monotonia do sistema agroalimentar
O Brasil é um dos países que mais sofrem com mudanças climáticas no mundo. Devido à sua grande extensão territorial e posicionamento geográfico, o País está sujeito a alterações repentinas no clima. Atrelado a essas mudanças, o movimento da agricultura brasileira em direção a outros biomas só agrava a problemática. “Não se trata de renunciar à capacidade que o Brasil tem de oferecer ao mundo grãos em larga escala e com preços muito competitivos. Nós temos que continuar fazendo isso. Só que os eventos climáticos extremos estão atrapalhando cada vez mais para a gente fazer isso. O deslocamento da produção de soja em direção à Amazônia, devido à seca no Cerrado, por exemplo, tem consequências gravíssimas”, detalha o pesquisador.
Outro componente da tríade abordada pelo INCT é o uso excessivo de antibióticos na pecuária. Abramovay afirma que o Brasil é, atrás apenas da China, o país que mais utiliza antibióticos na produção animal. Uma vez no ambiente e na alimentação das pessoas, o uso desses medicamentos implica diretamente questões sérias de saúde pública, como o aparecimento de superbactérias, pauta urgente nos hospitais e para a Organização Mundial da Saúde (OMS).
O avanço dos alimentos ultraprocessados na rotina alimentar das pessoas ao redor do mundo é outra questão abordada pelo projeto. Esse tipo específico de alimentos é um dos fatores principais nos altos índices de obesidade mundial. “O nosso projeto é tentar ver tudo isso junto. Em vez de segmentar, a nossa ambição é juntar todos esses fatores”, diz o professor.
Desafios
As estruturas e sistemas alimentares no mundo atualmente atrapalham significativamente uma possível mudança, visto que alcançaram uma força e estabilidade considerável. Contudo, Abramovay acredita no potencial que a agropecuária tem na transição para sistemas mais sustentáveis. “A transição não se faz sem uma parte muito importante do próprio setor empresarial. Os fazendeiros e o agro em geral, ao contrário do que muita gente pensa, também estão interessados nessa mudança. Eles estão sendo atingidos por esses eventos climáticos extremos e é fundamental para o País que eles encontrem, junto com a sociedade civil, com o governo e com a pesquisa científica, soluções”, complementa.
Fonte: Jornal da USP