O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) anunciou na última sexta-feira, 15, no Armazém Kobra, na zona portuária do Rio, três novos doadores para a iniciativa Viva Pequena África: Ford Foundation, Open Society Foundations e Instituto Ibirapitanga. A Ford Foundation e a Open Society Foundations doarão, cada uma, US$ 500 mil (cerca de R$ 2,9 milhões), enquanto o Instituto Ibirapitanga repassará à iniciativa, executada pelo Consórcio Viva Pequena África, formado pelo Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (Ceap), pela PretaHub e pela Diaspora.Black, a quantia de R$ 1,5 milhão.
A Pequena África é o pré-sal do movimento negro brasileiro: ela tem que ser valorizada como porta de entrada do que é a história do Brasil (Aloísio Mercadante)
O anúncio ocorreu durante painel organizado pelo Consórcio Viva Pequena África, com apoio do BNDES, para apresentar a importância do território da Pequena África e as ações em execução e previstas para o território nos próximos anos. “De modo geral, o patrimônio histórico está associado às elites brancas”, lamentou o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante. “A Pequena África é o pré-sal do movimento negro brasileiro: ela tem que ser valorizada como porta de entrada do que é a história do Brasil”.
Para Mercadante, o Cais do Valongo, reconhecido como patrimônio da humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), tem que estar no centro da identidade brasileira. “Queremos levantar uma memória histórica que tantas vezes tentaram apagar. O primeiro passo é reconhecer aqueles que resistiram no território há tempos”, afirmou.
O diretor da Fundação Ford no Brasil, Atila Roque, concorda. “A iniciativa é um passo importante no esforço de reparação e restauração da memória negra, um passo na construção de um projeto que tenha no legado da Pequena África o fundamento sobre o qual um futuro de igualdade e justiça social possa ser erguido”, afirmou. Atila lembrou que o povo negro teve “uma história marcada pela violência, mas também por sabedorias e aprendizagens que resistem e marcam profundamente o que somos como civilização brasileira”.
Heloisa Griggs, diretora de Aberturas Democráticas na América Latina e Caribe e líder para América Latina e Caribe na Open Society Foundations, afirmou que a instituição celebra a iniciativa e que se orgulha de apoiar esse e outros projetos da sociedade civil para preservar a cultura e a memória negra no país. “Apoiar a iniciativa Viva Pequena África é promover o direito à memória da população afro-brasileira e destacar seu papel essencial na história, no desenvolvimento econômico e na cultura do país, a partir de uma perspectiva reparadora”, dissse. “São as organizações, produtores culturais, artistas e o comércio local que continuam impulsionando a vida cultural e econômica da Pequena África. A democracia se fortalece quando Estado e sociedade civil trabalham juntos”.
Para a diretora de Programas do Instituto Ibirapitanga, Iara Rolnik, o Viva Pequena África é “uma ação estratégica de reconhecimento do papel histórico do Cais do Valongo e sua relação indissociável com as raízes da desigualdade racial no nosso país”. “O apoio do Ibirapitanga tem como premissas a preservação desse território e seu significado, bem como o fortalecimento de organizações da sociedade civil ali presentes capazes de sustentar e salvaguardar essa memória”, assegurou. “Este é um momento de celebração, mas sobretudo, de chamado de toda a sociedade para o envolvimento em ações consistentes de reparação do legado perverso da escravidão.”
A iniciativa Viva Pequena África conta com apoio não reembolsável de R$ 10 milhões do Fundo Cultural do BNDES. Ao todo, está previsto um investimento total de R$ 20 milhões em projetos e ações de capacitação e articulação das instituições de memória africana do território da Pequena África, para fortalecer as instituições culturais ali presentes e, com isso, fomentar o turismo cultural e a comercialização de produtos de afroempreendedores, conectando o território aos principais circuitos turísticos nacionais e internacionais.
Vencedor do processo de seleção pública conduzido pelo Banco para a execução da iniciativa, o Consórcio Viva Pequena África, formado pelo Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (Ceap), pela PretaHub e pela Diaspora.Black. A iniciativa Viva Pequena África se insere em um plano de ação capitaneado pelo BNDES, coordenado conjuntamente pelos ministérios da Cultura e da Igualdade Racial e que contempla também a estruturação do Distrito Cultural da Pequena África, com o desenvolvimento de instrumentos para a sustentabilidade do território, e obras de restauro, intervenções urbanas e implantação de equipamentos a serem definidos.
Segundo o conselheiro estratégico do Ceap, o babalawô Ivanir dos Santos, que é doutor em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o consórcio visa à promoção cultural, pedagógica, turísticas e empreendedora da região da Pequena África. “Não podemos nos esquecer que além de um lugar de memória nacional, ali estão parte das identidades e das resistências negras. Assim, a data de hoje marca mais uma ação de extrema importância para o andamento e fortalecimento das lutas coletivas das comunidades negras no Brasil”, afirmou.